Direito, políticas públicas
e afirmação pela cultura: o Jongo do Sudeste.
Em 1988, a Constituição Federal de traz a idéia de que o patrimônio cultural é construção
social, cabendo ao Estado a tarefa de reconhecê-lo e o proteger, tendo o apoio e a participação da
sociedade. Apesar deste reconhecimento constitucional, as ações efetivas só
foram tomadas a partir do Decreto n° 3.551/2000.
Deste
modo, este conceito passa a permear a vida social dos grupos e indivíduos
responsáveis por essas práticas e, para garantir a salvaguarda desses bens é
necessário apoiar os transmissores e mantedores de tais práticas e eles devem
ser instados a participar ativamente na identificação, reconhecimento, continuidade
e sustentabilidade das práticas.
Ao
conhecer a história da expressão cultural, as condições sócio ambientais e
materiais que garantem a existência e a análise
de os problemas que comprometem sua continuidade, tais grupos são alçados à
condição de detentores de saber socialmente válido, numa clara prática de ação
afirmativa, bem como na urgência em se garantir para essas populações,
geralmente em situação econômica de miserabilidade, acesso a políticas públicas
existentes ou a articulação na criação de medidas que lhes garantam não só a
subsistência, mas a dignidade que, historicamente lhes fora negada.
Tal
ação ocorre com o Jongo do sudeste, declarado patrimônio cultural nacional
imaterial pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em
15/12/2005. Manifestação cultural de origem afrodescendente,é uma “manifestação
cultural complexa, que transita no campo do sagrado e do profano, o Jongo é uma
instituição social na medida em que o conceito abrange, simultaneamente, a prática
divinatória, dança, canto, canções, melodia, instrumentos, o momento da confraternização
e o grupo social dos jongueiros”
De
manifestação que resistia em poucas localidades do Rio de Janeiro, São Paulo,
Minas Gerais e Espírito Santo, o Jongo, além de reflorescer em áreas onde era lembrança de homens e mulheres de cabeça branca, torna-se manifestação cultural
reconhecida e pesquisada . Tais ações evidenciaram problemas sociais de seus detentores
e a articulação em busca de algumas soluções: No Rio de Janeiro, a Comunidade de São José da Serra, foi
reconhecida como remanescente de quilombo, tendo acesso à benefícios legais,
como a inclusão nos créditos do programa de Agricultura Familiar, o
reconhecimento do título de propriedade de suas terras, a articulação com
outros atores sociais no intuito de se garantir outras fontes de renda, como o
artesanato, o agroturismo ou o turismo étnico, num esforço que contou com o apoio da Fundação Palmares, Universidades públicas, ONGs, pesquisadores, mas só foi viável pelo empenho e engajamento da própria comunidade no processo.
No Espírito
Santo, as comunidades de Jongo Mãe África, Pátria Amada, Brasil, de Presidente
Kennedy, Caxambu Mestre Bento, de Itapemirim, Caxambu Santa Cruz, de Monte
Alegre e Caxambu Alegria de Viver, de Vargem Alegre, Cachoeiro de Itapemirim
são algumas detentoras deste saber. Elas
vêm contando com algum apoio do poder público e de Organizações Não Governamentais.
Sabemos
que as ações culturais sozinhas não são suficientes para garantir acesso pleno à
cidadania de populações historicamente excluídas, mas o processo que as tira da
invisibilidade e as transforma em detentoras de um saber relevante,
além de restituir a autoestima, pode ser início de novas articulações governamentais,
sociais e ações legais para que tais agentes gozem de seus direitos e deveres
como cidadãos.
Contribuição de Renato de Alcantara
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